Prefeitos Podem se Desfiliar do Partido Político a Qualquer Momento

Print Friendly, PDF & Email

Por Paulo Roberto Gomes Ignácio – Especialista em Direito Público.


 

PREFEITOS PODEM SE DESFILIAR DO PARTIDO POLÍTICO A QUALQUER MOMENTO, SEM RISCO DE PERDA DO MANDATO

 

FIDEDELIDADE PARTIDÁRIA NO SISTEMA DE REPRESENTAÇÃO PROPORCIONAL

Somente se pode impor a perda do mandato eletivo se decorrer de maneira inequívoca da Carta Republicana, como ocorre no sistema proporcional (cuja vaga pertence ao Partido Político, em razão do quociente eleitoral), existindo fundamento constitucional bastante consistente para que se decrete a perda de mandato de certos parlamentares em alguns casos, pois mudar de partido depois de eleito é uma forma de frustrar a soberania popular.

 

FIDELIDADE PARTIDÁRIA x SOBERANIA POPULAR NO SISTEMA MAJORITÁRIO

Quanto a fidelidade partidária para cargos do sistema majoritário (cuja vaga pertence ao eleito, dado ter sido pela maioria dos eleitores), inexiste previsão explícita na Constituição Federal vigente para a perda do mandato, cuja regra da fidelidade partidária não consiste em medida necessária à preservação da vontade do eleitor. Portanto, a perda do mandato não é um corolário da soberania popular, esta última integrando o núcleo essencial do princípio democrático.

Nesse sentido, segundo a ADI 5081/DF (de 27.05.2015), por unanimidade de votos, o Plenário do STF entendeu que, “As características do sistema majoritário, com sua ênfase na figura do candidato, fazem com que a perda do mandato, no caso de mudança de partido, frustre a vontade do eleitor e vulnere a soberania popular (CF, art. 1º, parágrafo único; e art. 14, caput).”

Seguindo a orientação dada no julgamento da ADI 5081/DF, foi editada a Súmula 67 do TSE: “A perda do mandato em razão da desfiliação partidária não se aplica aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário.” (Publicada no DJE de 24, 27 e 28.6.2016).

 

REFORMA ELEITORAL x CONTRARIEDADE À SOBERANIA POPULAR

Entretanto, com a reforma eleitoral ocorrida em 29.09.2015, posteriormente à ADI 5081 do STF e à edição da referida Súmula 67 do TSE, houve mudança na legislação infraconstitucional (art. 22-A da Lei 9.096/95), sendo que o detentor de cargo eletivo não pode se desfiliar do partido sem justa causa, que são três:

  1. mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário;
  2. grave discriminação política pessoal; e
  3. mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.

Após, houve a Emenda Constitucional nº 91, de 18.02.2016, a qual facultou ao detentor de mandato eletivo desligar-se do partido pelo qual foi eleito nos trinta dias seguintes à sua promulgação, cuja eficácia foi temporária e se esvaiu nesse período delimitado na própria norma.

Em 28.09.2021, foi criada a possibilidade da união de partidos políticos em Federação, ficando sujeitos as mesmas normas que regem o funcionamento parlamentar e a fidelidade partidária, perdendo o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, de partido que integra federação (art. 11-A, §1º, §8º e §9º, da Lei nº 9.096/1995).

Portanto, seguindo a cronologia dessas decisões e legislação, sempre há a possibilidade de impugnação ao mandato pela mudança de partido pelo detentor de cargo eletivo, em razão da questão intertemporal da legislação citada.

 

JANELA PARA DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA

Destinada apenas aos membros do Poder Legislativo Municipal, consoante o atual Calendário Eleitoral (Resolução nº 23.738/2024 do TSE), a janela para mudança de partido (entre 7 de março a 5 de abril) abrangeu a desfiliação partidária somente de vereadores e vereadoras (art. 22-A, III, da Lei nº 9.096/1995), em consonância com a interpretação conforme à Constituição Federal dada pelo Plenário do STF na ADI 5081 (CF, art. 1º, parágrafo único; e art. 14, caput) e com a referida Súmula 67 do TSE.

 

PREFEITO PODE SE DESFILIAR SEM O RISCO DE PERDA DO MANDATO

Nesse contexto, mesmo que haja interpretação sobre o direito intertemporal da legislação citada, é razoável o entendimento constitucional de que ao eleito pelo sistema majoritário não se aplica as sanções pela desfiliação partidária, posto que o Plenário do STF fixou a tese de que: “A perda do mandato em razão da mudança de partido não se aplica aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário, sob pena de violação da soberania popular e das escolhas feitas pelo eleitor” (ADI 5081), tendo-se que a superioridade dos princípios constitucionais (CF, art. 1º, parágrafo único; e art. 14, caput) prevalece sobre a mudança legislativa infraconstitucional (art. 22-A, inciso III, da Lei 9.096/95), razão pela qual Prefeitos podem se desfiliar e mudar de partido sem o risco de perda do mandato, a qualquer momento.

Ademais, ainda que houvesse dúvida razoável da melhor interpretação do direito posto, é certo que vigora, na esfera peculiar do Direito Eleitoral, o princípio do in dubio pro sufrágio, segundo o qual a expressão do voto popular e a máxima preservação da capacidade eleitoral passiva merecem ser prioritariamente tuteladas pelo Poder Judiciário, esteira que também escuda da desfiliação de Prefeitos sem o risco de perda do mandato.

 

NOVA ELEIÇÃO

Quanto ao desfiliado disputar nova eleição, há que se observar o correspondente prazo legal para nova filiação partidária para fins de candidatura a Prefeito, conforme o respectivo Calendário Eleitoral.

 

REFERÊNCIAS:

Emenda Constitucional º 91, de 18 de Fevereiro de 2016

Emenda Constitucional nº 97, de 4 de Outubro de 2017

Súmula nº 67 do TSE

Resolução nº 23.738, de 27 de Fevereiro de 2024

Lei nº 9.096, de 19 de Setembro de 1995

Código Eleitoral – Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965

STF, ADI 5081/DF – Andamento Processual

STF, ADI 5081/DF – Acórdão (PDF)

.


em 10 Maio 2024, às 18:21 hrs.

Paulo Roberto Gomes Ignácio

Paulo Roberto Gomes Ignácio

Advogado e Consultor Jurídico at Advocacia Gomes Ignácio
Advogado atuante desde 1993.
Professor no Ensino Superior de Direito desde 2006.
Pós-Graduado com Especialização em Direito Público.
Formação Especializada com titulação em Docência de Alta Performance e em Teacher Leader Coach, conferida por Master Coach certificado pela Associação Internacional de Coaching e pela Sociedade Latino Americana de Coaching.
Membro do Conselho Editorial da Revista Ethos Jus.
Membro de Bancas Examinadoras de TCC.
Membro do Colégio de Professores, da Academia Brasileira de Direito Constitucional.
Parecerista do CONINCE - Congresso de Iniciação Científica Eduvale.
paulo@gomesignacio.adv.br (14) 3733-5165 e 3733-1064
Paulo Roberto Gomes Ignácio

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

error: Conteúdo Protegido !!!
Webmail Gomes Ignácio